A pesquisadora Velda Torres, em entrevista, aborda aspectos importantes para a inserção dos jogos digitais no ensino
Velda Torres é comunicóloga, mestre e doutoranda em Cultura e Sociedade (IHAC-UFBA). Ela também é integrante dos grupos de Estudo e Pesquisa de Práticas e Produtos da Cultura Midiática; e Pesquisa Comunidades Virtuais (UNEB). Em parceira com Lynn Alves, Velda escreveu o livro “Jogos digitais, entretenimento, consumo e aprendizagens: uma análise do Pokémon Go”. A publicação contém cinco capítulos que discutem o jogo, sob a perspectiva de ensino-aprendizagem.
Em entrevista, por e-mail, à Logos – Cultura Universitária, ela fala sobre os ganhos na educação escolar com a cultura digital. Para ela, o uso da cultura digital na educação estimula a participação do aluno no processo de ensino-aprendizagem. No entanto, um dos desafios para integrar os jogos digitais ao ensino, é a ausência de atividades de inserção à cultura digital voltadas para os docentes nas instituições de ensino.
LOGOS: Como surgiu a ideia de relacionar o jogo Pokémon Go com a aprendizagem de conteúdos escolares?
Velda Torres: Os games, mesmo quando não são criados com fins pedagógicos, apresentam, em sua estratégia narrativa, elementos que podem ser explorados na mediação da aprendizagem, e com o Pokémon Go não é diferente. A ideia de fazer um livro sobre esse potencial foi motivada pela repercussão que o lançamento do game teve entre sujeitos de todas as idades. Aproveitar essa aproximação dos alunos com um game é uma grande oportunidade para otimizar o processo de ensino-aprendizagem, utilizando-o como mediador nesse processo.
LOGOS: Quais são os principais benefícios do uso da cultura digital na educação escolar?
VT: O principal benefício é estimular o aluno a se aproximar mais do professor e do conteúdo escolar, levando-o a participar mais ativamente do processo de ensino-aprendizagem.
LOGOS: De que maneira o uso de jogos digitais pode aumentar a interação entre aluno e professor?
VT: Através da aproximação cultural que essa experiência promove, aluno e professor são, simultaneamente, posicionados como protagonistas no processo de ensino-aprendizagem, o que implica no maior envolvimento do aluno.
Os games apresentam em sua estratégia narrativa elementos que podem ser explorados na mediação da aprendizagem
LOGOS: Quais foram as dificuldades enfrentadas durante o processo de pesquisa para a escrita do livro?
VT: Não tivemos dificuldades no processo de produção. Os autores são professores pesquisadores que interagiram com o jogo. São também jogadores habituais. Todos nós fomos para rua jogar e observar outros jogadores. Nessa pesquisa de campo conversamos com crianças, adolescentes e adultos sobre a experiência com o game. Também pesquisamos informações sobre o Pokémon Go: mercadológicas, notícias divulgadas na mídia, produções de artigos envolvendo a sua utilização no processo de ensino-aprendizagem. Sistematizamos esses dados e iniciamos os trabalhos.
LOGOS: Que indicadores melhor traduzem a importância da inovação no processo ensino-aprendizagem?
VT: Considero que um dos principais indicadores é perceber o aluno engajado dentro do que se propõe nesse processo. Isso significa que o aprendizado irá fluir sem muita dificuldade e de modo mais prazeroso. Aliado a esse indicador, temos outro que é o resultado da aprendizagem: um conhecimento mais qualitativo, não apenas centrado no conteúdo, mas também na ampliação de habilidades que o aluno consegue desenvolver, como o letramento alfabético e digital, indo além da decodificação.
Um dos principais indicadores da inovação no processo ensino-aprendizagem é um aluno engajado
LOGOS: Na sua opinião, qual é o maior desafio enfrentado pelos professores para integrar a cultura digital ao ensino? E como eles devem encarar essa nova proposta?
VT: Um dos desafios está associado ao fato de que alguns professores não estão totalmente incluídos na cultura digital, o que implica na dificuldade em utilizar o smartphone para além do whatsApp e redes sociais. Desse modo, não conseguem explorar os recursos dos games e aplicativos gamificados disponíveis para mediação da aprendizagem. Associada a essa questão está a ausência de ações nas instituições de ensino para inserir esses professores na cultura digital, através de cursos e oficinas. Outro desafio é a precariedade da infraestrutura de algumas instituições de ensino que não oferecem suporte necessário para a utilização desses recursos em sala de aula, seja com relação aos equipamentos ou acesso à internet. Esses são apenas alguns exemplos, mas poderíamos elaborar uma lista muito maior de desafios. Nesse contexto desafiador da cultura digital, o professor deve aceitar o desafio de romper barreiras para se aproximar mais do perfil cultural do aluno e, assim, promover uma cultura mais participativa na sala de aula.
LOGOS: Essa experiência já foi testada em alguma escola?
VT: A experiência com o jogo Pokémon Go no processo ensino-aprendizagem tem sido relatada em muitos artigos. Inclusive, no nosso livro temos um capítulo de autoria de Rosemary L. Ramos e Antonete Xavier que aborda as possibilidades pedagógicas do jogo, referenciando experiências com diversas disciplinas que foram publicadas pelos professores que utilizaram o jogo. Também temos um capítulo escrito por Andersen Caribé de Oliveira e William de Souza Santos que aborda suas experiências na aplicação do jogo no ensino de história e matemática, respectivamente.
O professor deve aceitar o desafio de romper barreiras para se aproximar mais do perfil cultural do aluno
LOGOS: Como é a receptividade dos alunos às novas formas de aprendizado?
VT: Tem sido muito positiva, pois permite uma participação mais ativa no processo de ensino-aprendizagem, refletindo em maior interesse e envolvimento nesse processo.